terça-feira, 11 de outubro de 2011

As tantas primeiras coisas. (crônica)


Era noite.
Mais uma destas tão normais quanto a velha praça, que pouco a pouco enchia-se de energia. Os bancos eram de madeira e as árvores descabeladas pareciam crescer onde bem entendessem, sem quê nem porquê. A mágica daquele lugar apesar de visível e distinta, era viva, o que a fazia diferente das outras. Formada apenas pelas próprias pessoas, natureza e essas coisas que se moldam através do pensamento.
Mas hoje, havia uma coisa errada.
A calma que ali era sempre constante, estava sendo quebrada. E tamanha inquietação vinha do ponto menos iluminado e mais bonito onde se encontravam dois jovens, fazendo o que era inicialmente simples se tornar complicado, na mesma proporção em que água pura vira salobra.
A discussão era contínua e parecia haver começado a muito. Ela estava um pouco afoita e repetia automaticamente a frase “Isso não vai dar certo”. Enquanto ele apenas observava com um sorriso tanto irônico quanto sarcástico aquele ser tão difícil de lidar tentar consertar o trabalho de ciências, que segundo ela (e somente ela), estava errado.

Em seu ponto de vista, ela era tudo que há de errado em um ser humano: chata, arrogante, prepotente, cabeça dura, teimosa. A insuportável. A linda. A inteligentíssima Ana, que andava pra lá e pra cá com uma meia listrada e cabelo azul. Que o encantava pelo tom, pela profundidade que seu olhar escondia por entre os traços pretos de lápis barato. A louca. Que talvez ainda não soubesse, mas era a única pessoa que o impedia de cortar os cachos do cabelo loiro que caíam no seu rosto de traços tão finos.
E ali, naquele exato momento em que ele voltava a sua atenção para a pequena e brava criatura que parecendo cansada sentou-se também, que alguma coisa mudou. E de forma tão incompreensível quando inesperada, os dois que eram tão diferentes se tornaram por alguns segundos iguais. Os olhares se cruzaram, e partindo mais dele que dela que não sabia bem o que fazer nem como fora para ali, que o beijo aconteceu.

O primeiro dela. O melhor dele.  

E minutos que pareceram uma eternidade se passaram, fazendo desgrudar o que há muito já devia estar junto, e a confusão e o nervosismo tomaram conta fazendo com que o ar à pouco colorido se tornar pesado; as mãos se soltarem em um único ato, e a complicação entrar em êxtase.
Ela foi embora quase voando, ele permaneceu ali estático, parado e feliz, pensando em procurá-la no dia seguinte, por quê pode ser que ela também ainda não soubesse, mas ser bom só enquanto durou, não fazia seu tipo preferido de aventura.

(continua)